Orígenes (186 – 253) nasceu na cidade de Alexandria, no Egito e é considerado por muitos como o maior especialista na bíblia dos seis primeiros séculos do cristianismo.
Desde a infância recebeu uma educação cristã. Seu pai foi assassinado por perseguidores de cristãos quando ele ainda era um garoto. Dotado com uma enorme autodisciplina, Orígenes mergulhou nos estudos e tornou-se o homem mais jovem a liderar a Escola Catequética de Alexandria, comprovando a sua avançada capacidade intelectual.
Relatos afirmam que Orígenes viajou por quase todo o Império Romano e conheceu uma boa parte do Oriente. Durante essa jornada em busca de conhecimento recebeu instruções de mestres importantes como Clemente de Alexandria, Paulo de Antióquia e Amônio Sacas.
Ele sempre procurou manter seus estudos alinhados com uma interpretação não-literal das Escrituras, pois não acreditava na existência de uma separação absoluta entre ciência e religião.
Pré-existência da Alma, Karma e a Reencarnação
Após um estudo profundo da bíblia, Orígenes chegou à conclusão de que a reencarnação fez parte dos ensinamentos proferidos por Jesus, pois algumas passagens da bíblia só podem ser explicadas à luz da reencarnação.
“Toda alma vem para este mundo fortalecida pelas vitórias ou enfraquecida pelas derrotas da sua vida anterior. Seu lugar neste mundo é determinado pelos seus méritos ou deméritos anteriores. Seu trabalho neste mundo determina o seu lugar no mundo que se seguirá após este.”
Vemos nessas palavras de Orígenes uma definição clara daquilo que vários outros grupos espiritualistas nomeiam como Karma – Lei da causa e efeito – e como Reencarnação.
Deus não é o criador de nenhum favoritismo, pois é infinitamente justo. Como explicar então as diversas injustiças presenciadas dia-a-dia no nosso planeta? Orígenes questionava:
“Se a pré-existência da alma não é verdadeira, por que encontramos aqueles que sofrem devido a defeitos de nascimento sem ter feito mal algum?”
Para Orígenes, o objetivo da nossa existência no corpo material é a purificação das falhas cometidas em vidas anteriores e, com isso, subir novos degraus em busca da religação com Deus.
VEJA TAMBÉM: FERÉCIDES, A REENCARNAÇÃO E O KARMA
Nascimento e o corpo de Jesus
“O corpo de Deus não pode ser como o nosso.”
Orígenes rebate essa afirmação feita por Celso, dizendo que na sua vinda à existência material, Jesus Cristo obteve o seu corpo através da mulher que o gerou. Ele dizia:
“Jesus nasceu de uma mulher e por isso seu corpo é humano e sujeito à morte.”
A centelha divina de Jesus está contida no seu corpo espiritual e não no corpo de carne e osso. Esse detalhe não tornava Jesus menos sagrado e não alterava sua posição como Filho de Deus.
“Assim como Deus fez descer as almas no corpo dos homens e dos viventes, também fez descer no útero de Maria a força de sua Potência, e essa força gerou Jesus”.
A Mentira do Inferno
Segundo Orígenes, o conhecimento acerca de Deus está presente no íntimo de todo ser humano e pode ser despertado por meio da fé e do conhecimento. Dessa maneira, o espírito pode ascender até Deus numa longa e divina jornada de uma vida para a outra.
Dessa forma, o inferno não passa de uma zona temporária de natureza purgatória onde os espíritos perdidos na ignorância ficam restritos. Mas, o sofrimento nessa região não é eterno. A opção de se voltar a Deus através do remorso purificador está a disposição de todos os espíritos a qualquer momento.
Como Deus é atemporal e infinitamente misericordioso, todos os seus Filhos irão completar a jornada em busca da comunhão divina. Não há regresso no ponto de vista da evolução espiritual, apenas estagnação.
Concílio da Calcedônia
Avançando alguns séculos no tempo, chegamos ao ano de 451, quando a Igreja Católica Romana e a Igreja Ortodoxa estavam passando por um momento de turbulência e exagerada desconfiança mútua.
Nesse ano, o concílio da Calcedônia foi convocado pela Igreja Romana. O ponto chave dessa reunião foi a rejeição completa da doutrina do monofisismo proposta pelo bispo ortodoxo Eutiques.
Eutiques afirmava que Jesus Cristo tinha uma única natureza, ou seja, Ele era a encarnação literal de Deus na Terra, não possuindo um corpo de carne e osso como o dos outros homens, mas sim um corpo divino, não podendo ser vitimado pela morte.
A Igreja Romana discordava dessa teoria, pois segundo os estudos de Orígenes, Jesus foi gerado da mesma forma que qualquer outro ser humano, então seu corpo também era de carne e osso.
Imperatriz Teodora e o papa Vigílio
Teodora
Teodora nasceu num família extremamente pobre. Seu pai era domador de ursos em um circo, sua mãe morreu quando ela tinha quatro anos e sua irmã era uma famosa cortesã.
A pequena Teodora tratou de seguir os passos da irmã desde cedo. Ela chegou a trabalhar em peças teatrais bastante depravadas.
Não se sabe ao certo, mas em 527, Teodora conseguiu casar com Justiniano, imperador de Constantinopla. Com o intuito de limpar a sua imagem, ela inicia um combate ferrenho contra as mulheres que tiveram o desprazer de conhecê-la durante o período em que ela vendia o corpo.
Segundo o historiador Procópio (483 – 565), Teodora influenciava diretamente as decisões políticas e religiosas tomadas pelo Imperador Justiniano. Com a intenção de eliminar a desonra de ter sido uma cortesã e sentindo-se amedrontada pelas ideias da Reencarnação e do Karma, usou sua influência para que esses preceitos religiosos fossem abolidos da Igreja.
Papa Vigílio
Vigílio foi enviado como núncio papal até Constantinopla pelo Papa Bonifácio II em 530. Após 2 anos de estadia na capital Bizantina, Teodora conseguiu persuadir o ambicioso Vigílio a ajudá-la no seu plano de combater os estudos de Orígenes. Em troca, Vigílio receberia todo o apoio bizantino necessário para ser promulgado papa da Igreja Católica.
Com esse acordo em baixo do braço, ele voltou a Roma acompanhado pelo general Belisário e seu numeroso exército. Após um golpe executado contra o legítimo papa Silvério, Vigílio conseguiu assumir o posto mais alto da hierarquia católica e enviou seu adversário Silvério para o exílio forçado, onde este viria a morrer.
Segundo Concílio de Constantinopla
Após alcançar o posto de papa, Vigílio não conseguiu apoio suficiente na Igreja Ocidental para impor as modificações sugeridas por Teodora. A imperatriz ficou tão furiosa que ordenou a captura e transporte do papa de Roma para Constantinopla no ano de 545.
O imperador Justiniano com a intenção de acalmar o acirrado clima de tensão e exibir o seu poder político, organizou um concílio composto na sua totalidade por políticos locais e membros do clero ortodoxo.
Nenhum bispo da igreja católica foi convocado para participar dessa reunião. Nem mesmo o próprio papa, que estava recluso na cidade, teve permissão para participar desse encontro que ficou conhecido como o Segundo Concílio de Constantinopla.
O concílio foi de crítica importância para o cristianismo, pois foi devido a ele que a reencarnação passou a ser considerada uma heresia e aqueles que ousassem mencioná-la seriam punidos com a excomunhão. Os dois enunciados abaixo exemplificam esse teor restritivo:
“Qualquer pessoa que afirme a falsa pré-existência da alma e se submeta à monstruosa doutrina que segue essa afirmação, será excomungada.”
“Se alguém disser que Cristo encarnou em sangue e carne como os nossos e tornou-se homem para os homens; e não professar que Deus, o Verbo, humilhou-se e tornou-se homem, será excomungado.”
Inicialmente, com medo de ser executado por traição contra seus compatriotas ao voltar para Roma, o papa Vigílio se recusou a assinar qualquer acordo que legitimasse as novas regras discutidas nesse concílio. Mas, com a pressão de Justiniano e Teodora aumentando, o papa terminou por ratificar as novas regras propostas durante o segundo concílio de Constantinopla e, após 8 anos preso em Constantinopla, recebeu a permissão para retornar a Roma.
Hoje nós vemos católicos e evangélicos defenderem tão fervorosamente esses preceitos sem nunca ao menos terem parado para estudar o golpe político por trás de tais “verdades”.
Legado de Orígenes
Orígenes foi perseguido e torturado durante o governo de Décio, por volta do ano 250 e veio a falecer três anos depois.
Como vimos nos parágrafos acima, ele viria a ser excomungado por Justiniano no ano de 553. Esse fato contribuiu para o desaparecimento de quase todas as suas obras direcionadas ao estudo da reencarnação. Ninguém queria correr o risco de ser preso ou morto por carregar um livro herético.
Para mim, os fatos não deixam dúvidas de que o imperador Justiniano convocou o Segundo Concílio de Constantinopla com o objetivo de abolir o avanço espiritual através do conhecimento, estipular novas regras para facilitar o controle da população, fortificar o poder eclesiástico e estimular uma maior arrecadação financeira para os cofres da igreja.
Junte-se a isso ao poder persuasivo de uma mulher que temia com todas as suas forças a possibilidade de pagar seus pecados através de outra encarnação na Terra.
A história da Igreja Católica está manchada pelas mãos sujas de sangue e corrupção de pessoas em busca de uma fácil redenção e movidas pela cobiça e ambição.
Orígenes foi um mártir e seu legado está a salvo aqui nesse simples texto.
Via http://caosnosistema.com/origenes-e-a-reencarnacao-na-biblia/
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