Juan G. Bedoya
Na homilia que Bento 16 pronunciou no último domingo na Igreja da Sagrada Família [em Barcelona], houve um parágrafo que confirma o papel secundário da mulher no catolicismo romano. Foi quando ele lembrou que os mecenas do grande Gaudí quiseram mostrar ao mundo, com a basílica, o exemplo de lar formado pelo casamento de Maria e José, com seu filho Jesus, o fundador cristão. "A Igreja defende medidas econômicas e sociais adequadas para que a mulher encontre no lar e no trabalho sua plena realização", proclamou o papa depois de pedir aos governos "mais apoio" para a família entendida como na Nazaré de 2.000 anos atrás.
Como se houvesse dúvida, o papel secundário da mulher seria representado nesse momento, durante a cerimônia de unção do altar. Primeiro o papa derramou crisma –azeite consagrado– no centro e nos cantos do altar e ungiu toda a mesa. Paralelamente, dois cardeais e dez bispos abençoaram as paredes da igreja. Depois o papa queimou incenso com generosidade em um braseiro –"Que se eleve minha oração, senhor, diante de vós, como o incenso, e assim como esta casa se enche de perfume agradável também vossa Igreja exale o bom odor de Cristo", rezou o pontífice. Retirado para o trono papal, seis diáconos percorreram a nave incensando os assistentes.
Foi nesse momento, quando as hierarquias celebrantes haviam regressado a seus lugares, que apareceram quatro freiras, com hábitos meticulosamente pré-conciliares, para proceder, com santidade familiar, à secagem da mesa e à colocação de um tecido impermeável e, sobre ele, um manto branco.
Nem o papa falou mais da mulher nem houve outra presença feminina na cerimônia, a não ser a avassaladora presença de mulheres aproximando-se para que centenas de clérigos lhes dessem a comunhão. A rainha Sofia também comungou, mas não o rei Juan Carlos. A feminização se repete a cada domingo no orbe católico. Sem a mulher, há tempo que a Igreja Católica seria uma instituição sem pulso, com templos vazios e uma atividade caritativa muito reduzida.
Mas o papa não dá o braço a torcer. "Dos inúmeros pecados cometidos ao longo de sua história, de nenhum outro deveriam arrepender-se tanto as Igrejas como do pecado cometido contra a mulher", opina Uta Ranke-Heinemann, companheira de faculdade do teólogo Ratzinger na Munique dos anos 1950. O pior não havia chegado. Em 15 de julho passado, o papa Ratzinger reformou o Código Vaticano para endurecer as penas dos delitos mais graves que podem ser cometidos em seu seio. Junto com a pederastia, incluiu a ordenação sacerdotal de mulheres.
A instituição que pretende ser uma referência moral acentuava assim uma antropologia dualista, na qual ser mulher é empecilho para ter acesso ao sagrado. Dissimuladamente, o Vaticano continua ancorado em Aristóteles, feito doutrina por Tomás de Aquino. Os dois viram a mulher como um desvio no processo de formação, como um "arren peperomenon" ("varão mutilado"), traduzido ao latim por Aquino como "mas occasionatus" ("varão malogrado"). Aí se sustenta a subordinação da mulher, seu proclamado reinado no lar. Feia história, que não se acaba.
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