“Decisão do TCE impede MPC de solicitar informações a órgãos do Governo do Estado do Ceará.”
Por Bené Fernandes
O Ministério Público de Contas (MPC) está proibido de solicitar diretamente informações e documentos a qualquer órgão do Governo do Estado. A decisão foi tomada pelo Tribunal de Contas do Ceará (TCE-CE) na última terça-feira, 19. Além disso, todas as pastas do Executivo estadual receberão ofícios determinando que não respondam a questionamentos do MPC.
A decisão revoltou a Associação Cearense do Ministério Público (ACMP), que promete recorrer à Justiça. Na visão da entidade, a defesa do patrimônio público ficará comprometida. Segundo o presidente da ACMP, Rinaldo Janja, tal fato deixa patente que “o Tribunal de Contas do Estado, ao adotar sobredita decisão, impondo obstáculos ao poder de investigação do MPC, olvida dos preceitos da Lei de Acesso à Informação, que autoriza qualquer cidadão buscar dos órgãos públicos as informações desejadas”.
Por conta da decisão do TCE, a Associação Nacional do Ministério Público de Contas (AMPCON) também já estuda as medidas administrativas e judiciais que irá adotar, não descartando a representação por ato de improbidade contra os responsáveis.
Rinaldo Janja avalia ainda que a decisão se iguala, em termos de inconstitucionalidade, à Proposta de Emenda Constitucional 37, conhecida como PEC da Impunidade, que limita os poderes de investigação do Ministério Público. “Neste ponto, durante o julgamento, o conselheiro Rholden Queiroz (que juntamente com a Conselheira Soraia Victor foram vencidos) alertou à Corte de Contas, em feliz comparação, que a decisão do TCE-CE tem o mesmo caráter da PEC-37, pois proíbe o Ministério Público de investigar”, argumentou.
Ele acrescenta que o entendimento do TCE-CE ofende o artigo 9º da Lei Estadual n.º 13.720/2005 combinado com o artigo 116, “b” da Lei Orgânica do Ministério Público do Estado do Ceará, além do artigo 10 da Lei de Acesso à Informação. Tais dispositivos legais, garante, dão embasamento à solicitação de informações e de documentos feita aos órgãos da administração estadual pelo MPC.
O presidente da ACMP denuncia ainda que o processo votado há dois dias foi colocado em julgamento de surpresa, não constando na pauta da sessão. Fora isso, não haveria qualquer documento que permitisse sua consulta no Sistema de Acompanhamento de
Processos do Tribunal. “Diante deste cenário, evidencia-se então que, além de violar frontalmente as prerrogativas e pretender tolher a atuação do Ministério Público de Contas, O Tribunal de Contas do Estado do Ceará desborda de sua competência, prestando um desserviço à sociedade cearense, para, na prática, advogar em favor do sigilo, que é a exceção e não a regra na Administração Pública”, sublinha.
De acordo com a ACMP, a decisão do TCE-CE “torna-se um fato extremamente grave, uma vez que impede o Ministério Público de Contas de solicitar documentos e informações aos gestores públicos, tornando-se verdadeiro obstáculo ao poder de investigar do MPC. Portanto, mantém-se firme a convicção de que, não obstante às dificuldades enfrentadas, os esforços que movem a atuação em prol do bem comum devem continuar, motivo pelo qual serão buscados os meios judiciais cabíveis, a fim de assegurar as prerrogativas funcionais do MPC”.
Segundo o presidente da AMPCON, Diogo Roberto Ringenberg, a decisão do TCE é “algo a se lamentar e evidencia um órgão público desconectado da realidade republicana que vivemos. O TCE-CE contraria, inclusive, os objetivos estabelecidos pelo plano estratégico da Associação dos Membros dos Tribunais de Contas, que preconiza o ‘estímulo à transparência das informações das decisões e da gestão dos Tribunais de Contas’”. Ringenberg avalia ainda que “ao decidir embaraçar uma prerrogativa elementar do MP, atentando contra o seu bom funcionamento, o TCE adotou uma postura irresponsável, totalmente contrária ao interesse público e ao dever de lealdade às instituições”.
Essa decisão, segundo o Ministério Público de Contas, já havia sido ventilada pelo ex-presidente do TCE, Teodorico Menezes, afastado no episódio conhecido como escândalo dos banheiros. “A medida agora adotada causa prejuízo irreparável à atuação institucional do MPC/CE, pois o órgão está sendo desautorizado perante seus jurisdicionados”, finaliza o presidente da AMPCON, Diogo Roberto Ringenberg.
Procurado pelo O POVO, o presidente do TCE-CE, Valdomiro Távora, confirma a decisão, mas esclarece que o assunto já havia sido deliberado em 2009. Entretando, o Ministério Público de Contas teria continuado a solicitar informações da gestão estadual. Valdomiro explica ainda que o MPC é um órgão especial, não tendo as mesmas competências do Ministério Público comum. Logo, jamais poderia seguir a mesma legislação do MP, e sim as regras da Corte de Contas.
“Temos nossa própria legislação. Requisitar informações, documentos, é papel do conselheiro relator. Em seguida o presidente do TCE emite ofício aos jurisdicionados”, afirma, ressaltando que o próprio Supremo Tribunal Federal (STF) já definiu que o MPC é um órgão especial. Ele traça um paralelo com os trâmites da Justiça comum, destacando que quando um procurador ou um promotor quer se dirigir ao presidente do Tribunal de Justiça, ele o faz por meio do procurador-geral.
“O Ministério Público de Contas não tem a autonomia que o Ministério Público comum tem. Ele é diferente, precisa seguir as nossas regras. Estou apenas cumprindo a norma”, reforça. Para o presidente do TCE, o MPC está querendo fazer as vezes de conselheiro. “E isso eu não vou admitir”.
Legislação que fundamenta o questionamento do MPC:
Artigo 9º da Lei Estadual n.º 13.720/2005: Ao Ministério Público Especial aplicam-se, subsidiariamente, no que couber, as disposições da Lei Orgânica do Ministério Público do Estado do Ceará.
Artigo 116 da Lei Orgânica do Ministério Público do Estado do Ceará: No exercício das suas funções, o Ministério Público poderá: I – instaurar inquéritos civis e outras medidas e procedimentos administrativos pertinentes e, para instruí-los:
[...]
b) requisitar informações, exames periciais e documentos às autoridades federais, estaduais e municipais, bem como aos Órgãos e entidades da administração direta, indireta ou fundacional, de quaisquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;
Artigo 10º da Lei Geral de Acesso à Informação: Qualquer interessado poderá apresentar pedido de acesso a informações aos órgãos e entidades referidos no art. 1º desta Lei, por qualquer meio legítimo, devendo o pedido conter a identificação do requerente e a especificação da informação requerida.
Legislação que fundamenta a decisão do TCE:
Artigo 11 do Regimento Interno do TCE: Compete ao Presidente, além do disposto no art. 78 da Lei Orgânica:
(…)
II- representar o Tribunal perante os Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;
VI – expedir ofício encaminhando aos dirigentes da Administração Pública servidor do Tribunal que deva cumprir diligências ou realizar inspeções ou
auditorias determinadas pelo Plenário, pelas Câmaras ou pela própria Presidência, nos termos do caput do art. 94 da Lei Orgânica;
Artigo 87-B da Lei Orgânica do TCE: O Ministério Público Especial junto ao Tribunal, submetido aos
dispositivos da Lei n? 13.720, de 21 de dezembro de 2005, zelará, no exercício de suas atribuições, pelo cumprimento desta Lei, competindo-lhe:
I – promover a defesa da ordem jurídica, requerendo perante o Tribunal as medidas de interesse da Justiça, da Administração e do Erário (…)
(…)
VII – representar, motivadamente, perante este Tribunal de Contas do Estado, pela realização de inspeções, auditorias, tomadas de contas e demais providências em matéria de competência do Tribunal.
Redação O POVO Online
com informações
da assessoria da ACMP
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