por Júlio Bernardes, da Agência USP
Região sudeste do Brasil possui média de 2,7 médicos para cada 1.000 habitantes. Foto: Marcos Santos / USP Imagens
O relatório do estudo “Demografia Médica no Brasil”, elaborado por pesquisadores da Faculdade de Medicina (FMUSP) da USP, mostra que apesar do número de médicos ter crescido 557% nos últimos 40 anos no País, chegando a dois profissionais para cada 1.000 habitantes, sua distribuição pelo território nacional é cada vez mais irregular, concentrando-se principalmente nas capitais das regiões sudeste e sul. O levantamento, divulgado em 18 de fevereiro na sede do Conselho Federal de Medicina (CFM), em Brasília, também descreve o perfil e a distribuição dos médicos especialistas.
“O estudo contou os médicos de várias formas, ao confrontar bases e fontes distintas, segundo o registro nos Conselhos Regionais de Medicina (CRMs), contratos formais de trabalho, cadastro e ocupação em estabelecimentos de saúde”, afirma o professor Mário Scheffer, do Departamento de Medicina Preventiva da FMUSP, que coordenou a pesquisa. O Brasil possui atualmente 400 mil médicos. De 1970, quando havia 59 mil médicos, até hoje, houve um salto de 557%. No mesmo período a população brasileira cresceu 101%. A partir do ano 2000 houve um saldo de crescimento 6 a 8 mil médicos por ano, devido a entrada (novos registros) ser maior que a saída (aposentadorias, mortes etc). “A idade média é 46 anos e 41% dos médicos têm menos de 40 anos, com perspectiva de longevidade profissional. É também uma profissão cada vez mais feminina, tendência irreversível desde 2009”, destaca o professor.
A região sudeste alcança 2,7 médicos por 1.000 habitantes. Quem mora na região sul e sudeste conta com duas vezes mais médicos que os habitantes do norte, nordeste e centro oeste (excluindo o Distrito Federal). “Quem vive em alguma capital conta com duas vezes mais médicos que os que moram em outras regiões do mesmo estado”, conta Scheffer. “A diferença entre os extremos, morador do interior de um estado do norte, nordeste, e centro oeste, e o residente de uma capital do sul ou sudeste, é de quatro vezes, no mínimo”.
Quem tem plano de saúde no Brasil conta com pelo menos quatro vezes mais médicos à disposição do que quem depende exclusivamente do Sistema Único de Saúde (SUS). “A persistência e a intensidade das desigualdades de distribuição demonstram que apenas o aumento global do quantitativo de médicos pode não garantir a disponibilidade de médicos nos locais, nas especialidades e nas circunstâncias em que hoje há carência de profissionais”, enfatiza o professor. “Há necessidade de mudanças substantivas nos rumos do sistema de saúde, a começar pela solução do subfinanciamento público, pelo balanço crítico do processo de privatização da gestão do SUS e de seu impacto sobre os recursos humanos, e pela regulação mais eficiente do mercado de planos de saúde.”
Movimentação dos médicos
Em 2012, 197 escolas médicas ofertavam aproximadamente 17 mil vagas. Mais de 180.000 médicos não concluiu programa de Residência Médica ou não tem título de especialista. “É um cenário preocupante de deterioração do ensino de graduação e da falta de vagas na Residência para todos os egressos de cursos de Medicina”, diz Scheffer. Sete especialidades concentram mais da metade dos profissionais titulados, sendo que quatro áreas básicas (Pediatria, Ginecologia e Obstetricia, Cirurgia Geral e Clínica Médica) tem 37% dos médicos.
O levantamento sobre a movimentação espacial dos médicos – onde nasceram, onde se formaram e onde atuam hoje – sugere que a localização dos cursos de medicina não é fator determinante de fixação dos médicos ali graduados. “A maioria deles termina por se fixar nos grandes centros por certo em busca de oportunidades de emprego, melhores salários, condições de trabalho, formação, crescimento profissional e condições de vida para a família”, alerta o professor da FMUSP.
A maior parte dos médicos formados fora do Brasil — tanto brasileiros quanto estrangeiros — se instala nas maiores cidades, especialmente no sudeste. “É um indício de que eventuais flexibilidades de revalidação de diplomas poderão não surtir o efeito desejado de suprir definitivamente locais hoje desprovidos de médicos”. O estudo também constatou que a concentração dos médicos acompanha a existência de serviços de saúde e de outros profissionais, principalmente de dentistas e enfermeiros.
“A configuração das estruturas e dos equipamentos de saúde, o atrativo das condições coletivas de exercício profissional, a oferta de emprego e renda, jogam a favor da instalação dos profissionais de saúde nos grandes centros”, ressalta o professsor. “O levantamento lança novo olhar sobre as especialidades médicas ao cruzar bases de dados antes incomunicáveis e ao incorporar a segunda e a terceira escolha dos especialistas”. O foi patrocinado pelo CFM e o Conselho Regional de Medicina de São Paulo (CRM-SP). O estudo na íntegra pode ser acessado no site www.portalmedico.org.br.
* Publicado originalmente no site Agência USP.
(Agência USP)
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