por Thalif Deen, da IPS
A presidente Dilma Rousseff foi a primeira mulher a abrir o período ordinário de sessões da Assembleia Geral. Foto: UN Photo/Marco Castro
Nações Unidas, 9/11/2012 – Quando um país-membro da Organização das Nações Unidas (ONU) decide realizar uma conferência do fórum mundial em seu território, tem o privilégio de presidir o encontro e também de ser o primeiro orador. Contudo, desde a criação da ONU há 67 anos, o Brasil sempre abriu as sessões da Assembleia Geral em Nova York, uma prerrogativa que, na realidade, caberia aos Estados Unidos, país anfitrião, que participa em segundo lugar. Graças a esta tradição, sem explicação lógica inclusive dentro da ONU, a presidente Dilma Rousseff se converteu na primeira mulher desde a fundação das Nações Unidas a abrir o período ordinário de sessões em setembro deste ano. Foi imediatamente seguida pelo presidente norte-americano, Barack Obama.
Na última década, durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2011), o Brasil participou de nove missões de paz da ONU, foi anfitrião de importantes conferências multilaterais (em particular a cúpula Rio+20, em junho de 2012) e contribuiu ativamente com discussões sobre a reforma do fórum mundial. Também trabalhou para fortalecer o Conselho Econômico e Social (Ecosoc) e fomentou maior protagonismo da ONU na promoção do desenvolvimento.
O Brasil também é membro fundador do Grupo dos 77, a maior coalizão de países em desenvolvimento dentro do sistema das Nações Unidas, e é o décimo maior contribuinte para o orçamento regular da ONU, com US$ 38 milhões no último ano fiscal. Considerado uma das novas potências emergentes, o Brasil tem um papel fundamental em duas das mais poderosas coalizões internacionais: Ibas (Índia, Brasil e África do Sul) e Brics (Brasil Rússia, Índia, China e África do Sul).
O presidente do Fórum de Reitores do Rio de Janeiro, Cândido Antônio Mendes de Almeida, disse à IPS que o papel do Brasil na comunidade internacional está estreitamente vinculado à emergência do Brics, “fora das clássicas periferias e com uma crescente influência na África, especialmente nos países de idioma português”. “O assento permanente no Conselho de Segurança será uma consequência inevitável para o Brasil”, afirmou Antônio Mendes, autor de mais de 30 livros, delegado brasileiro em várias conferências internacionais e secretário-geral da Academia de Latinidade.
Junto com Alemanha, Índia e Japão, o Brasil é parte do Grupo dos Quatro (G-4) e um dos favoritos para ocupar um assento permanente no Conselho de Segurança, ofuscando a Argentina, outro potencial competidor da América Latina. “Ao mesmo tempo, o novo enfoque brasileiro na América Latina incluiu uma forte condenação ao golpe de Estado no Paraguai, uma alternativa à escalada antinorte-americana dos Estados bolivarianos e um comércio bilateral em expansão com a Argentina”, acrescentou Antônio Mendes.
O G-4 continua trabalhando estreitamente para alcançar a meta de “um Conselho de Segurança mais representativo, democrático e transparente, em linha com as atuais realidades geopolíticas”. O grupo acredita que a reforma é uma conta pendente e que uma demora maior pode afetar a capacidade do Conselho para enfrentar os novos desafios e afetar a efetividade e legitimidade de suas decisões.
“O Brasil acredita que a reforma do Conselho de Segurança é perfeitamente realizável e que se pode obter um resultado positivo no futuro próximo”, disse à IPS um porta-voz da missão brasileira na ONU. “É nossa esperança que as negociações intergovernamentais na Assembleia Geral (atualmente em marcha) ganhem impulso nos próximos meses, e que isso possa ter resultados concretos nos principais aspectos da reforma”, acrescentou.
Como membro não permanente, o Brasil integrou por dez vezes o Conselho de Segurança. E, até o mês passado, forneceu 2.200 soldados e policiais para nove missões de manutenção da paz da ONU, em Chipre, Costa do Marfim, Haiti, Líbano, Libéria, Saara Ocidental, Sudão, Sudão do Sul e Timor Leste. As maiores contribuições foram as missões no Haiti (1.894 soldados) e Líbano (268).
Embora o Ibas sempre procure impulsionar a cooperação Sul-Sul e fortalecer as relações econômicas e comerciais entre as nações em desenvolvimento, conseguiu maior influência quando os três países, por coincidência, ocuparam assentos não permanentes no Conselho de Segurança, em 2011. Diante dos desafios sem precedentes da Primavera Árabe e no contexto da crise econômica global, os membros do Ibas mantiveram um diálogo muito estreito nesse órgão da ONU.
Os três países também articularam uma posição comum frente ao processo de paz palestino-israelense. Esta postura ficou expressa na Declaração de Tshwane, de 2011, e no primeiro comunicado conjunto do Ibas em um debate na Assembleia Geral nesse mesmo ano sobre a questão palestina. Por outro lado, o Fundo Ibas, para o alívio da pobreza e da fome, apoia projetos em Timor Leste, Guiné-Bissau, Laos, Palestina, Serra Leoa, Sudão, Sudão do Sul e Vietnã.
Com relação à crise na Síria, o Ibas adotou uma postura comum em julho-agosto de 2011, transmitindo uma proposta ao regime em Damasco, baseada em uma clara condenação à violência contra civis, em um chamado pelo fim das hostilidades e por um verdadeiro compromisso com um diálogo político para o pleno respeito dos direitos humanos e das liberdades básicas. Como disse Dilma Rousseff à Assembleia Geral: “Não há solução militar para a crise síria. A diplomacia e o diálogo não são apenas nossa melhor opção, mas a única opção”.
Quando o Brasil avançou em alguns dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, incluindo o alívio da fome e da pobreza, o ensino primário universal, combate ao HIV/aids e na sustentabilidade ambiental, ficou para trás em uma meta crucial: o empoderamento de gênero. Como recordou um diplomata brasileiro a delegados na ONU no mês passado, pela primeira vez na história uma mulher assumiu a Presidência de seu país.
No entanto, as mulheres continuam tendo escassa representação nos postos de tomada de decisões no Brasil. Embora representem cerca de 52% dos eleitores brasileiros, as mulheres só têm representação de 10% no Poder Legislativo. E apenas dez dos 38 ministérios são encabeçados por mulheres. Porém, o diplomata assegurou que Dilma Rousseff reconheceu como uma prioridade “fortalecer a participação das mulheres em altos níveis de tomada de decisões”. Envolverde/IPS
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