Hoje o assunto é a versatilidade do caju, que tanto serve como cosmético, contra micoses e acne, como gel na prevenção da maldita placa bacteriana. E da resina de cajueiro ainda se fazem sensores de laboratório, bons para detectar coisas tão diferentes quanto poluentes na água e níveis de dopamina, um neurotransmissor que revela se o paciente está ou não desenvolvendo Alzheimer e Parkinson.
A castanha de caju, torrada e salgada, é o principal produto comercial extraído do cajueiro. Mas, nem de longe, é a única riqueza obtida dessa planta nativa, originária do Nordeste brasileiro, cientificamente chamada Anacardium occidentale. A par dos tradicionais sucos, doces e da goma – utilizada como espessante e estabilizante em diversos alimentos – a versatilidade do caju ramifica-se pelo universo dos laboratórios, além de render patentes de cosmecêuticos (ou seja, de cosméticos com função de medicamento).
Uma dessas patentes – e talvez a ação mais notável de substâncias presentes no caju – é a de um gel para combater a placa bacteriana.
“Identificamos atividades antimicrobianas de substâncias extraídas do caju-roxo e testamos diversos produtos dermatológicos e tópicos bucais”, conta Jane Sheila Higino, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). “Verificamos a inibição de bactérias e fungos, favorecendo os processos de cicatrização de ferimentos, de tratamento de micoses de pele e de redução de acne e furúnculos. E um dos resultados mais interessantes foi o de inibição da fixação de Streptococcus mutans na boca”.
A bactéria mencionada pela pesquisadora é uma das primeiras a aderir aos dentes, seguida de outros micro-organismos que, acumulados e fixados uns sobre os outros, dão origem à placa bacteriana. Ao evitar a fixação de S. mutans, o gel à base de caju interrompe todo o processo e previne a formação da placa.
Diante de tais resultados, outra pesquisadora integrante da equipe, Margareth Formiga de Melo Diniz, diretora do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal da Paraíba (CCS/UFPB), deu início ao desenvolvimento de um creme dental e um gel de uso preventivo, para escovação diária, e um deogel de tratamento, para ser usado com aplicador. As patentes já foram depositadas pelo Laboratório de Tecnologia Farmacêutica da UFPB. Agora é questão da indústria se interessar para estes produtos chegarem ao consumidor final.
Esse mesmo cajueiro, que ‘descola’ placas bacterianas nas pesquisas do Nordeste, ainda serve para ‘colar’ filmes finíssimos, conforme estudos realizados na Universidade Federal de São Carlos, em São Paulo. “A resina ou goma de caju contém grupamentos de substâncias químicas com as quais se produz uma solução carregada negativamente, que intercalamos com outros materiais”, conta Carla Eiras, da UFSCar.
O ‘sanduiche’ de materiais toma a forma de um filme positivo-negativo com espessura da ordem de nanômetros (um nanômetro = um metro dividido por um bilhão). E deste filme finíssimo se fazem sensores para diversas finalidades, semelhantes, por exemplo, aos testes domésticos de gravidez ou aos papeizinhos usados para medir acidez (pH).
Os sensores feitos com filmes à base de resina de caju já se mostraram eficientes na detecção da presença de fertilizantes com hidrazina em rios e lagos; em testes de contaminação da água com cromo 6, um poluente cancerígeno resultante do tratamento de couro, em indústrias de calçados; e na quantificação de níveis de dopamina em pacientes com suspeita dos males de Alzheimer e Parkinson.
“Acredito que possamos desenvolver, com a resina do cajueiro, um sensor para o neurotransmissor dopamina, semelhante ao que já existe para controle de diabetes, ou seja, portátil e de leitura digital”, afirma Carla Eiras. De quebra, ela ainda participa de uma avaliação da qualidade da resina, isolando, purificando e comparando o material colhido em uma floresta natural de caju com aquele proveniente de uma plantação.
Que todas estas pesquisas dêem frutos tão abundantes e substanciais quanto o nutritivo caju e sua valiosa castanha!
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