quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Putin, os ventos dos valores cristãos vêm do Leste

 

19 de fevereiro de 2014 (www.msia.org.br) - O título pode parecer estranho a quem tenha moldado a sua opinião sobre o presidente russo Vladimir Putin com base no noticiário habitual da mídia ocidental, largamente influenciada pelos interesses do componente anglo-americano do Establishment oligárquico internacional – que, durante a Guerra Fria, se arvorava em fiadora dos valores cristãos ocidentais -, quase invariavelmente crítica de tudo o que se refira ao líder do Kremlin. Por ironia, Putin tem sido apoiado nos EUA por um punhado de veteranos pensadores conservadores, que reconhecem nele um dos raros estadistas em serviço verdadeiramente comprometidos com a defesa dos valores fundamentais da civilização, em especial, a Ocidental, abandonados pelos líderes que professam promovê-los, a começar pelos próprios EUA.

De fato, além de empenhar o peso político e estratégico-militar da Federação Russa em um amplo esforço para o solucionamento dos conflitos e contenciosos que ameaçam a paz mundial, Putin tem se apresentado como um firme defensor dos valores morais tradicionais da maioria das sociedades, contra a tsunami de “relativismo cultural”, “correção política” e “ideologia de gênero”, que se tornaram endêmicas entre os defensores do estabelecimento de um “governo mundial”. Não por acaso, tem recebido um importante apoio do papa Francisco, com quem compartilha uma mesma trincheira. Em dezembo, Putin aprovou uma lei proibindo a veiculação de propaganda para a promoção do aborto, como parte de uma estratégia para reverter o colapso demográfico do país.

Igualmente, na semana passada, o Parlamento aprovou uma lei que proíbe a adoção de crianças russas por casais homossexuais e pessoas solteiras provenientes de países onde a prática seja permitida. É neste contexto que deve ser avaliada a lei que proíbe qualquer propaganda de promoção do homossexualismo em situações que possam influenciar crianças e adolescentes, que tanto ruído tem provocado na mídia ocidental.

Em seu discurso sobre o estado da união, em 12 de dezembro último, Putin observou:

Hoje, muitas nações estão revisando os seus princípios morais e as suas normas éticas e, com isto, estão erodindo as éticas tradicionais e as diferenças entre os povos e culturas. Agora, a sociedade é convocada, não só para reconhecer o direito de todos à liberdade de consciência e de visão política e à privacidade, mas também a aceitar sem questionamentos, por mais estranho que pareça, a igualdade entre o bem e o mal – conceitos cujos significados são opostos. Esta destruição de valores tradicionais, de cima para baixo, não só tem conseqüências negativas para a sociedade, mas também é essencialmente antidemocrática, pois é construída sobre ideias abstratas e especulativas, contrárias ao desejo da maioria, que não aceita as mudanças que estão ocorrendo ou as mudanças de valores propostas. Sabemos que há cada vez mais pessoas no mundo que apoiam a nossa posição de defender os valores tradicionais que constituem os pilares morais e espirituais da sociedade, desde há milhares de anos: os valores das famílias tradicionais, a vida humana real, em especial, a vida religiosa, não apenas a existência material, mas também a espiritualidade, os valores do humanismo e da diversidade em escala mundial.

O primeiro a chamar a atenção para o fato foi o jornalista Patrick Buchanan, ligado ao Partido Republicano, mas um crítico permanente das políticas intervencionistas e belicistas de Washington e das concessões às tendências “politicamente corretas”, que se tornaram epidêmicas na atualidade. Em um artigo publicado, dias depois, em seu sítio oficial, e posteriormente reproduzido em dúzias de outros, ele dispara:

É Vladimir Putin um paleoconservador? Na guerra cultural pelo futuro da humanidade, ele é um de nós? Embora tal pergunta possa parecer blasfema nos círculos ocidentais, considerem o conteúdo do discurso do presidente russo sobre o estado da união. Claramente, com os EUA em mente, Putin declarou: “Agora, a sociedade é convocada, não só para reconhecer o direito de todos à liberdade de consciência e de visão política e à privacidade, mas também a aceitar sem questionamentos, por mais estranho que pareça, a igualdade entre o bem e o mal.”

Tradução: embora a privacidade e a liberdade de pensamento, religião e opinião sejam valores incensados, igualar o casamento tradicional com o casamento homossexual é igualar o bem e o mal. Aqui, não há confusão moral, isto é claridade moral, concorde-se ou discorde-se. (…)

Tampouco, ele deixa de ter razão quando refletimos sobre a adoção, nos EUA, do aborto sob encomenda, do casamento homossexual, da pornografia, da promiscuidade e de toda a panóplia dos valores de Hollywood. Nossos avós não reconheceriam os EUA em que vivemos. (…)

Em todo o mundo, afirma Putin, cidadãos estão apoiando a “defesa dos valores tradicionais” que a Rússia vem fazendo contra uma “assim chamada tolerância”, que se mostra “assexuada e infértil”. Apesar de a sua posição de defensor dos valores tradicionais ter atraído o escárnio da mídia e das elites culturais ocidentais, Putin não está errado quando diz que ele pode falar por grande parte da humanidade.

Depois de Buchanan, foi a vez de William S. Lind, diretor da revista The American Conservative e um dos mais lúcidos estrategistas do país, tendo sido um dos criadores do conceito de “guerra de quarta geração”, para qualificar os conflitos entre Estados nacionais e forças não-estatais. Como Buchanan, Lind é um crítico feroz da militarização da política exterior estadunidense, à qual atribui a finalidade principal de justificar os colossais orçamentos do Pentágono. Em sua coluna regular, publicada em 11 de fevereiro, ele afirma:

Com o presidente Vladimir Putin, a Rússia está emergindo outra vez como a principal potência conservadora. Como testemunhamos no resgate russo do presidente Obama, do canto do ringue em que ele havia se metido na Síria, hoje, como o New York Times relata, o Kremlin está “estabelecendo o papel da Rússia nos assuntos mundiais, baseado, não no paradigma obsoleto da Guerra Fria, mas com um enfoque diferente, que favorece a soberania dos Estados e a estabilidade do status quo, sobre a disseminação da democracia ao estilo ocidental”. (…) Moscou parece entender melhor que Washington que, no século XXI, o principal requisito de política exterior é a preservação do Estado diante da guerra de quarta geração travada por entidades não-estatais, como as que estão combatendo na Síria, no lado dos rebeldes. A Rússia tem criticado Washington, corretamente, por destruir Estados como o Iraque e a Líbia. (…)

O mundo virou de pernas para o ar. Os EUA, condenando e até atacando outros países, para promover a “democracia” e definições jacobinas dos direitos humanos, estão se tornando os líderes da esquerda internacional. A Rússia está reafirmando o seu papel histórico como líder da direita internacional. Esta é uma inversão de importância histórica. A política externa estadunidense deveria se basear nos interesses dos EUA, e não numa afinidade por qualquer potência estrangeira. Mas colocar os EUA em primeiro lugar não requer hostilidade contra a Rússia ou quem quer que seja. Ao contrário: os conservadores estadunidenses deveriam dar as boas-vindas à ressurgência de uma Rússia conservadora.

Não é difícil concordar com a conclusão explícita de Buchanan e Lind, de que o presidente russo ocupa hoje uma posição singular entre os chefes de Estado e de governo do planeta, como defensor dos valores cristãos que fundamentam a ideia do Estado nacional soberano, que a humanidade precisa recuperar, se quiser reverter a presente decadência moral induzida pelos defensores de uma ordem mundial oligárquica.

(foto:  ALEXEI NIKOLSKY)

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