Por Natalia Ruiz Díaz, da IPS
Assunção, Paraguai, 28/7/2010 – As expectativas sobre o cumprimento do acordo assinado há um ano com o Brasil, que retribuirá ao Paraguai os reclamados benefícios gerados pela compartilhada Represa de Itaipu, se renovam diante da visita, no dia 30, do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. É que para que sejam implementados os distintos compromissos contidos no convênio falta ainda a ratificação do Congresso brasileiro, o que já foi feito pelo parlamento paraguaio.
Entre os 31 pontos do acordo, figura o financiamento pelo Brasil da construção de uma linha de transmissão de energia de 500 quilowatts e o aumento das compensações anuais ao Paraguai, que devem passar de US$ 120 milhões para US$ 360 milhões, pelo uso de energia excedente por parte do Brasil.
A reclamação sobre Itaipu foi um dos temas centrais da campanha eleitoral que levou à Presidência do Paraguai o ex-bispo católico Fernando Lugo, que assumiu, em agosto de 2008, apoiado por uma ampla coalizão, deixando para trás 61 anos de hegemonia da direitista Associação Nacional Republicana, mais conhecida como Partido Colorado.
Para Ricardo Canese, ex-coordenador da Comissão de Órgãos Hidrelétricos, o convênio demonstra que Brasília reconhece a soberania paraguaia e seu legítimo direito a pleitear mudanças no tratado original, assinado em 1973. Esse tratado estabeleceu as bases para o aproveitamento hidrelétrico do Rio Paraná pelos dois países, dando origem ao complexo de Itaipu, considerado o maior do mundo em capacidade de geração de energia elétrica.
“Alguns setores dizem que foram pedidas migalhas e que por isso o Brasil não nos dá importância. Se fosse assim, o parlamento desse país já teria aprovado o acordado sobre as compensações”, disse o especialista à IPS, referindo-se ao aumento dos valores a serem recebidos pelo Paraguai a título de cessão de energia. O tratado estabelece que cabe ao Paraguai 50% da energia, dos quais utiliza apenas 5%. Por isso ficaria com 45% para vender, o que só pode fazer para seu sócio.
Segundo Ricardo, o compromisso do presidente Lula está intacto, mas a campanha com vistas a eleger seu sucessor atrasa uma definição sobre o assunto. “Não pedimos privilégios, mas justiça, igualdade, e todos os setores do Brasil, políticos e energéticos, sabem que é assim”, afirmou. Por sua vez, Daniel Codas, vice-presidente do Partido Pátria Querida (PPQ, de centro-direita) assegurou que as dúvidas sobre o acordo ocorrem porque até agora não foi cumprido nenhum dos prazos colocados pelo próprio Lula. “Nada se fez de concreto em um ano, além do mais, baixaram as pretensões de compensação e nem mesmo isso se conseguiu no prazo”, disse.
Segundo Daniel, há dúvidas porque a aprovação do acordo passa por interesses que vão além do próprio mandatário brasileiro em seu país, e que o erro de Fernando Lugo foi gerar muitas expectativas em torno do assunto. No governo paraguaio, a posição é de otimismo e assegura-se que a rejeição pelo parlamento do Brasil não ocorrerá, porque a responsabilidade política em nível internacional é muito grande. “Se não houver um acordo, o Paraguai terá todas as chances de ganhar se recorrer aos fóruns internacionais, pois foi o Brasil que reconheceu, ao assiná-lo, que as reclamações de Assunção são justas”, disse Ricardo.
Para a construção da linha de transmissão de 500 quilowatts, já estão em andamento as licitações para obras de subestações. Seu comprimento terá cerca de 345 quilômetros, distância entre Hernandarias, na região Oriental, e Villa Hayes, na região Ocidental. “Está previsto que em agosto comecem as obras na subestação de Villa Hayes, e as linhas, redes e transformadores deverão estar prontos no máximo em dezembro”, arfirmou Ricardo. Com esta obra, o Paraguai terá acesso mais amplo à energia de Itaipu, e poderá utilizá-la na produção e para os serviços que o país precisa.
A situação atual é de grande produção de energia hidrelétrica, em meio a um déficit crônico de linhas de transmissão, o que, por sua vez, gera crise de abastecimento. Ricardo entende que o governo de Fernando Lugo recebeu um sistema elétrico totalmente caído, precário e defasado das reais necessidades do país, devido à falta de investimento de várias décadas.
O custo da obra da linha de transmissão, de US$ 400 milhões, será financiado pelo Fundo de Convergência Estrutural do Mercosul (Focem), criado por este bloco intregrado pelos dois países mais Argentina, Uruguai e Venezuela em processo de adesão plena. Este instrumento do Mercosul responde a objetivos solidários e se baseia em um mecanismo de transferência direta de recursos das economias maiores do bloco, isto é, Brasil e Argentina, para outras economias menores.
Agora o olhar está voltado para o Brasil. Embora a visita de Lula não responda ao tema, será um termômetro para medir se efetivamente se está avançando para o cumprimento do acordo em torno da grande represa binacional. Envolverde/IPS
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