17:08 04.07.2025 (atualizado: 20:47 04.07.2025)

© Foto / Rafa Neddermeyer / BRICS Brasil / PR
No
segundo encontro após a expansão inédita no número de membros e com a
entrada de novos países parceiros, o Rio de Janeiro recebe a cúpula de
chefes de Estado do BRICS entre os dias 6 e 7 de julho. Especialistas
analisam à Sputnik Brasil as expectativas e o peso do evento.
A cada dia, novos desafios globais surgem e reforçam o papel do Sul Global
nas decisões internacionais. Desta vez, os olhares do mundo se voltam
para o seu principal grupo, o BRICS, cuja cúpula acontece em meio à crise no Oriente Médio, que por pouco não viu uma guerra total entre um de seus membros, o Irã, e Israel, a situação na Ucrânia e pautas tradicionais do grupo, como comércio, desdolarização e fortalecimento do mundo multilateral.
O
professor associado de política internacional e comparada da
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Dawisson Belém Lopes lembra
ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, que o Rio vai receber a cúpula dois anos depois do anúncio da maior expansão da história do BRICS.
"Já
houve tempo de o arranjo expandido se acomodar. Então vai ser especial
porque vamos conseguir, de fato, ler o que os atores pretendem fazer
daqui por diante. Lembrando que o Brasil [que está na presidência
rotativa do grupo] fez no fim do ano passado um outro evento grande, que
foi também o encontro de chefes de Estado do G20, e terá no fim de 2025
a COP30 [Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas]. É
uma grande tarefa logística", resume.
4 de julho, 12:56
Para
o especialista, este é um momento em que o Brasil está em "máxima
visibilidade internacional" e tem a oportunidade de atuar em várias
frentes: "Na multilateral, com a COP, e na plurilateral, em que conecta o Sul Global ao Ocidente com o BRICS, que é um grupamento genuinamente do Sul Global, talvez o mais importante entre todos os grupos que existem hoje."
Já
o professor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da
Fundação Getulio Vargas (FGV EAESP) Guilherme Casarões enfatiza ao
Mundioka que o país assumiu a presidência do grupo em um dos momentos
mais complexos da geopolítica mundial moderna e, diante disso, a aposta para a cúpula é que a diplomacia brasileira adote "uma receita muito parecida com a usada no encontro do G20".
Conforme o especialista, na ocasião, as discussões tiveram como foco três temas que permitem a adoção de "consensos mínimos" e que ainda possibilitam ao Brasil exercer "algum tipo de liderança".
"Um
deles são as mudanças climáticas e transição energética, que é muito
importante, até porque o Brasil já vem exercendo uma liderança
multilateral e pode construir algum tipo de acordo importante no BRICS,
que representa também uma fatia significativa dos exportadores de
combustíveis fósseis em nível global. O segundo é o combate à fome e à
pobreza, uma marca registrada do presidente Luiz Inácio
Lula da Silva, que deve tentar ampliar a aliança global. E, por fim,
uma reivindicação histórica, que é a reforma da governança global", cita
Casarões.
'BRICS é importante demais para a gente fingir que não existe'
Apesar de ser deixado em segundo plano na cobertura midiática, inclusive do Brasil, o professor Dawisson Belém Lopes lembra que o BRICS é um grupo representativo em vários âmbitos, respondendo por quase 40% da economia global e mais de 48% da população do planeta.
"Então
não adianta querer fechar os olhos para esse movimento. Em termos de
paridade de poder de compra, o grupo abriga cinco das oito maiores
economias, além de potências nucleares, concentração de biodiversidade e recursos naturais, inclusive minerais raros e críticos, de potencial energético quase que inesgotável", diz.
O
especialista pontua ainda que "há certa má vontade" do Ocidente,
principalmente com o BRICS, por ser um movimento que contesta e revisa os pilares da ordem internacional estabelecidos após a Segunda Guerra Mundial.
"Parte dessa cobertura tímida tem a ver com o posicionamento
ideológico. Mas não adianta, o BRICS é importante demais para fingir que
não existe."

BRICS deve mostrar ao mundo que é possível criar novo modelo de financiamento, brada Lula4 de julho, 10:54
Ausências importantes no BRICS: cúpula no Rio deve ter menor importância que a de Kazan?
Questionado sobre uma eventual perda de importância estratégica da cúpula no Rio em relação a Kazan, que ocorreu na Rússia no ano passado,
o especialista em relações internacionais pontua que o Brasil está "em
uma encruzilhada em que sedia vários encontros internacionais". Além
disso, enfatiza que Moscou vivia uma situação diferente na época, de
tentativa de isolamento pelo Ocidente, por conta da operação militar especial na Ucrânia.
"Mesmo assim, sou otimista, mas temos que lembrar que […] a cúpula de Kazan tinha um sentido muito especial para os russos,
quase como uma espécie de redenção para um país que foi tentativamente
desconectado do sistema internacional pelo Norte Global", justifica.
Outro ponto citado por Dawisson Belém Lopes são as ausências dos presidentes Vladimir Putin (Rússia), Xi Jinping (China) e Abdel Fattah al-Sisi (Egito) —
um problema a ser gerenciado pelo Brasil. "Mas ainda entendo que haverá
muitos fatos importantes, decisões sensíveis sendo tomadas no Rio de
Janeiro. Eu não subestimaria o evento enquanto um produtor de decisões
relevantes para as relações internacionais."

Sanções financeiras são ferramenta de manipulação política, diz Dilma em evento do Banco do BRICS4 de julho, 10:22
Há risco de fragmentação interna do BRICS?
Diante da diversidade de culturas, costumes e posicionamentos diplomáticos dos países do BRICS, que une desde a América Latina à África até a Ásia e Europa,
divergências sobre os desafios globais podem ser comuns. Apesar disso, o
professor da UFMG acredita que há mais pontos de concordância do que o
contrário e, para além disso, os Estados têm encontrado laços que os unem.
"Esse
conflito entre Israel e Irã não é um tema que coesiona o BRICS de ponta
a ponta, por exemplo. A Índia, que é um membro fundador, mantém relações muito boas com Israel.
Então não esperemos uma posição em uníssono, porque não vai acontecer.
Isso vale para praticamente qualquer outro tópico em que você pode
encontrar divergências pontuais. Mas os Estados têm sabido explorar
aquilo que os conecta, e vejo que essa é a virtude do grupo", defende.
Por fim, o especialista foi questionado se há possibilidade no futuro de o BRICS se tornar um bloco, a exemplo de Mercosul e União Europeia.
Para Belém, esse não é necessariamente um objetivo e, por isso,
considera o BRICS o "primeiro movimento revisionista de potências médias
[com exceção de China, Rússia e, em pouco tempo, Índia]".
"A
maioria dos países tem relevância regional, mas ainda assim conseguiram
se coordenar e fazer a diferença, com efeitos muito importantes na cena
internacional. Então essa é a novidade, e isso jamais aconteceu antes.
Quando existia um movimento de não alinhados, havia pouquíssima
capacidade de intervenção e de criar um programa de ação efetivo […].
Agora, o BRICS não. Ele tem um projeto geopolítico e quer alcançar suas
metas em todos os campos das relações internacionais."
Fonte: https://noticiabrasil.net.br/20250704/cupula-do-brics-no-rio-o-que-esta-em-jogo-para-o-brasil-e-o-sul-global-41047667.html
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