sexta-feira, 4 de agosto de 2023

‘Quem viola o Código Penal, na rua ou nas redes, tem que ser punido’, diz Dino

 

Rio de Janeiro - RJ

Regulamentar a ação de empresas de tecnologia no Brasil para impedir a prática de crimes digitais é uma das prioridades do Ministério da Justiça e Segurança Pública, comandado pelo ex-governador do Maranhão Flávio Dino. A pasta hoje conta com uma assessoria especial voltada para Direitos Digitais que tem se articulado para atualizar a legislação brasileira.
“Mudança climática é gravíssima, corrida armamentista é gravíssima. Mas, para mim, a maior ameaça que está hoje na esquina da humanidade é esse abuso geral em relação a essas tecnologias”, destacou o ministro Flávio Dino, em entrevista exclusiva concedida à Lupa.
Uma das medidas defendidas pelo ministro para impedir esses abusos é a aprovação do  PL 2.630/2020, apelidado de “PL das Fake News”. A expectativa de Dino é que, com o retorno das atividades do Congresso nesta semana, e um clima melhor no parlamento, o projeto volte à pauta para ser votado.
“O Projeto de Lei 2.630 é um imperativo histórico. Não significa dizer que ele deva ser aprovado em todos os seus termos ou exatamente tal como se encontra. O que eu me refiro é que é fundamental, imprescindível, urgente que ele seja votado. Ou seja, que o Brasil atualize a sua legislação”, destacou. 
Na entrevista, Dino também falou sobre o papel do Ministério da Justiça no monitoramento de crimes na internet para evitar novos ataques à democracia e frisou que movimentos coordenados de desinformação na internet, como aconteceu na última semana, após a divulgação dos avanços na investigação da morte da ex-vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, vão ser investigados. 
“As pessoas vão dizer que é censura, que é a ditadura, mas eu estou só cumprindo a lei. Quem viola o código penal na rua ou na rede, tem que ser punido. É lei. Esse é meu papel”, afirmou. 
Confira os principais trechos da entrevista do ministro Flávio Dino à Lupa:
O PL 2.630 foi retirado de pauta em maio por causa da resistência de muitos deputados na Câmara. Desde então, o relator Orlando Silva e membros do governo, inclusive o senhor, têm dialogado com parlamentares sobre o projeto. O senhor tem esperança que esse texto seja votado na Câmara? Acredita que os impasses foram superados?
O Projeto de Lei 2.630 é um imperativo histórico. Não significa dizer que ele deva ser aprovado em todos os seus termos ou exatamente tal como se encontra. O que eu me refiro é que é fundamental, imprescindível, urgente que ele seja votado. Ou seja, que o Brasil atualize a sua legislação. Acredito que essa leitura vá se tornar progressivamente majoritária na sociedade e, por conseguinte, também nas casas parlamentares.
Nós tivemos um primeiro semestre com muitas dificuldades. Algumas derivadas do 8 de janeiro, outras derivadas de um intenso conflito político, normal do início de um novo governo. [Houve ainda] a formação de uma base parlamentar — posteriormente o foco em pautas econômicas, notadamente o arcabouço e a reforma tributária.
Quando essas pautas fenecerem, agora com a retomada em agosto, acho, sim, que se abre uma janela importante que deve ser aproveitada para temas de natureza institucional, inclusive esse, de uma lei brasileira de combate à desinformação.
Para a Lupa, o deputado Orlando Silva falou que o projeto vai voltar para a pauta com a definição de quem terá a responsabilidade de fiscalizar a internet. Há alguns dias, falou-se que o governo quer que esse trabalho seja da CGU. Na opinião do senhor, qual é o melhor modelo de fiscalização para a lei?
É fundamental acentuar que nós não vamos ter no Brasil uma entidade governamental para fiscalizar o que cada pessoa posta na internet. Na verdade, se cuida de um sistema para fiscalizar os procedimentos das plataformas quando elas não cumprem os seus deveres jurídicos — relativos à emissão de relatórios de transparência, deveres de cuidado, análise de risco e assim sucessivamente, além dos casos em que fundamentadamente se identifica a violação de regra jurídicas por intermédio do mau uso das plataformas. Então não haverá uma fiscalização universal, uma espécie de “Big Brother” da internet.
O segundo ponto a ser acentuado é que nem vai haver nenhum sistema de censura, nem o governo quer exercer sozinho esse papel de instância fiscalizadora das plataformas. O Congresso Nacional tem se debruçado sobre vários modelos. 
Tenho frisado que o modelo híbrido é um que me agrada particularmente bastante. Híbrido no sentido de envolver vários poderes do Estado e a sociedade civil. Então, acho que você terá, sim, um locus, ou seja, um órgão de governo, um órgão de Estado liderando, e aí há várias versões, mas com ampla participação social e controle judicial de modo a preservar a liberdade. Acho que o deputado Orlando vai caminhar nessa direção.
Caso o PL não avance na Câmara, que outras formas de regulação o governo pretende buscar? O STF poderia fazer isso?
Em qualquer tema que nós venhamos a tratar, sempre haverá incidência de múltiplas regulamentações. É da natureza da própria conformação do direito, sociedades contemporâneas, que você tenha várias fontes de normatividade. O presidente Lula tem, por exemplo, acentuado a importância de regulações supranacionais. Isso, em algum momento, ocorrerá, porque nós temos assuntos que não podem ser versados ou deslindados apenas por um único país. Por exemplo: mudanças climáticas, guerras, corrida armamentista, desinformação via internet.
Além disso, nós temos legitimadas pela Constituição outras duas fontes normativas. Nós temos, sem dúvida, primacialmente Congresso Nacional, parlamento, Poder Legislativo, mas temos outras duas fontes normativas. Uma você já alude, o próprio Poder Judiciário mediante o julgamento de Ações Diretas de Inconstitucionalidade versando sobre o Marco Civil na Internet e, portanto, atualizando ou reinterpretando e fixando com efeito vinculante qual a aplicação mais adequada dessa lei que existe no Brasil. E nós temos, por último, a terceira fonte normativa, que é a própria atuação do Poder Executivo. Vimos isso no tema relativo à violência contra escolas e nós temos também apoiado e participado de uma intensa atividade de auto-regulamentação das plataformas.
Nós queremos que haja uma lei, agora isso não exclui a múltipla incidência de várias atividades, inclusive das próprias empresas e dos outros poderes do Estado.
Um dos fatores que prejudicou o debate sobre o PL 2.630 foi a disputa de narrativas, principalmente nas redes sociais, entre governistas e oposição, e que se reduziu entre censura e não censura. Nesse sentido, diversos estudos apontam que a oposição ganhou esse debate digital, e não só esse, mas como vários outros que são feitos nas redes. É preciso melhorar a forma da base do governo se comunicar? O que falta para fazer uma disputa mais equilibrada nas redes?
Sempre é um desafio, não existe perfeição em nenhuma atividade humana. Eu mesmo procuro, a cada dia, com a nossa equipe aqui no Ministério da Justiça, melhorar a nossa atuação, a forma, adequar às exigências contemporâneas. Vejo também esse debate organizado no governo. Agora, é evidente, nós temos uma dificuldade maior quando um tema mais complexo é traduzido apenas em slogans — porque essa extrema-direita é, além de tudo, despudorada, ou seja, ela atua de modo muito desavergonhado. Então, na época [da votação do PL 2.630], se dizia que o projeto iria censurar a Bíblia, que iria impedir a leitura do Antigo Testamento. 
Então, são, assim, coisas bizarras que transitam muito rapidamente, infelizmente. E nós tentamos, naturalmente, contrapor ou contrastar mentira com indicadores verdadeiros, que acentuem ou realcem o absurdo desses discursos. Não é uma atividade fácil, não é simples, mas nós não podemos incidir no mesmo erro dessa gente — um erro ético, eu diria. Então nós temos que atuar segundo os nossos princípios, a busca da verdade, mostrar que são coisas absurdas. E essa derrota, vamos chamar assim, momentânea, num certo momento nas redes sociais, serve de acúmulo para mais adiante a gente conseguir ter a hegemonia da verdade e, com isso, legitimar uma saída no âmbito dos Três Poderes do Estado.
Para o senhor, essa derrota no debate digital, principalmente no caso do PL 2.630, influenciou o debate dentro da Câmara? Poderia ter sido diferente?
Acho que mais importante do que essas coisas bizarras que foram difundidas foi a atitude das próprias plataformas. Acho que isso foi decisivo. Ou seja, nós tivemos uma militância muito aguerrida, muito inusitada, eu diria — ultrapassando, inclusive, fronteiras legais por parte dessas plataformas —, e isso acabou influenciando. Veja que, no ambiente em que nós operamos, até mesmo a maioria conquistada pelo discurso de ódio, de desinformação — não estou afirmando, mas — pode ter sido impulsionada pelas próprias plataformas que estavam defendendo interesses empresariais, interesses comerciais.
Então, acho que houve, naquele momento, uma conjunção de fatores. Parlamentares que foram conquistados por esses discursos absurdos sobre a Bíblia, outros que foram influenciados pelo poder econômico das plataformas atuando de modo também bastante contundente, anômalo. E também essa questão da maioria quantitativa, eu diria, na circulação de ideias nas plataformas naqueles dias.
Vamos perseverar, corrigir aspectos do projeto, para formar a maioria parlamentar. O deputado Orlando tem cuidado disso. E, ao mesmo tempo, há temas que você tem que passar por um processo de acúmulo da formação de opinião na sociedade. Há mudanças fundamentais no Brasil que demoraram décadas. Acredito que esta não irá demorar décadas, mas, com certeza, alguns meses ainda vamos consumir em torno disso.
Flávio Dino, ministro da Justiça e da Segurança Pública
O senhor é uma vítima constante de conteúdos falsos. A Lupa recentemente desmentiu uma publicação que informava sua participação na Parada LGBTQIA+ de São Paulo. Muita gente criticou o episódio dizendo que era um meme, viu como uma brincadeira, mas e o senhor? E por que desmentir fakes como essa é importante?
Na verdade, ali, em outras postagens, não há esse intento humorístico. Essa gente não serve nem para fazer humor. Essa gente é violenta, é odienta, é hedionda, é agressiva, é baixa, é abjeta, é vil. Então, se fosse uma coisa humorística, claro que não me importaria, mas não era. Na verdade, faz parte de um ecossistema de divulgação de ódio.
Eles já disseram que eu estava reunido com traficantes, que matei gente, que sou envolvido com roubo de carga. Então, eles tentaram compor ali uma coisa que poderia ser até normal — se um ministro ou uma autoridade do governo participasse de um evento público, não tem nada demais nisso —, e se eventualmente houvesse um propósito de humor muito menos teria qualquer lesividade. Mas não é isso.
Essa gente, repito, não presta nem para fazer humor. É uma gente do mal que faz essas coisas. E eles fazem exatamente para poder tentar fazer prevalecer o seu exótico ideário, é uma gente despótica. Fazem isso o tempo inteiro. Eu convivo com isso, infelizmente, de um modo muito concentrado. Nunca tinha visto coisa igual, nunca tinha vivido coisa igual. Fui governador, fui deputado federal, fui juiz. Nessa escala, eu nunca vi. Uma escala industrial de produção de ataques, todos os dias.
Todos os dias eles inventam algum tema esdrúxulo de uma reunião que eu não fui, de um evento que não houve, de um processo que eu não respondi, eles inventam. Então, nós lutamos muito contra isso todos os dias e faz parte do ethos desse pessoal que acha que o poder vale qualquer coisa. Eles buscam desumanizar as pessoas, destruir, atropelar, vilipendiar, emparedar. Agora comigo não conseguem, né? Na verdade, até tenho uma grande capacidade de resistir. Cansa, não é uma coisa confortável e isso se traduz em violência nas ruas.
Isso que a gente vê de agressão física, espaço público, eu sofro. Esse ano, mais de 10 [vezes] em local público. Isso vem da onde? Dessa atitude na internet. E a pessoa vai ficando com ódio, a pessoa te vê dentro de um avião, no shopping, numa loja, te vê num local comum. E a pessoa te olha com ódio, como se eu fosse uma espécie de vilão de filme da Netflix. De onde vem isso? Vem dessas coisas da internet. Por isso que é uma gente perigosa.
Essa gente mata. Essa gente tem a mão suja de sangue, é uma gente criminosa. Porque é essa gente que instiga ataques contra escolas, que instiga automutilação de adolescente, que instiga suicídio de adolescente. Por isso, é muito importante, do ponto de vista civilizacional, que a gente atualize a lei brasileira.
O anúncio de avanços na investigação sobre a morte da ex-vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes veio seguido do compartilhamento, na internet, de antigas informações falsas envolvendo outros crimes, como o assassinato do ex-prefeito Celso Daniel. Isso, em questão de horas. O senhor acredita que existe um movimento coordenado? Isso pode vir a ser investigado?
Pode e deve ser investigado. No caso da Marielle, houve dois assassinatos: um físico e um moral. O que fizeram com a vereadora Marielle nos dias subsequentes é realmente um massacre contra a imagem dela — inclusive com a participação de pessoas do mundo institucional, notadamente no Poder Judiciário. Então, isso é razoável? Ter uma família chorando um brutal assassinato e ainda nos dias seguintes conviver com uma tentativa vil, execrável, de transformar a vítima em algoz?
E esses anos todos isso acontece. Na segunda-feira [24 de julho, dia do anúncio do avanço nas investigações do caso], eu me surpreendi porque dei a entrevista coletiva e depois sentei aqui nesta cadeira. Menos de uma hora [depois], a internet estava repleta de invencionices, inclusive essas tentativas de desviar o foco. Isso é um processo fordista industrial, não tem chance de isso ser espontâneo com essa velocidade. E, sim, nós estamos o tempo inteiro aprimorando os sistemas de controle criminal.
Sem dúvida, é uma tendência, porque isso não é piada, não é luta política legítima. Nós temos que entender isso, isso é reprovável. Isso é ilegal. Isso é criminoso. E por isso é importante, é fundamental, que o Estado atue contra isso.
O governo federal se elegeu prometendo combater a desinformação. Passados alguns meses, qual é hoje a estratégia de combate à desinformação?
Aqui no Ministério da Justiça, me cabe a parte mais criminal, de violação da lei, e o debate sobre novas leis. Então, nesse aspecto, tanto naquilo que diz respeito à Secom, quanto no que diz respeito ao Ministério da Justiça, eu diria que o cenário de hoje é substantivamente melhor do que o de 2 de janeiro. Inclusive porque, antes de nós, as pessoas que estavam no governo eram arautos da desinformação. Eles alimentavam as atividades criminosas, lideravam, em larga medida — basta ver o que foi feito na pandemia.
Não era o governo federal que dizia que era gripezinha, que o vírus não matava? Não era o presidente da República que dizia que a vacina fazia mal? Era. Então, já é uma mudança. O governo que está aqui hoje, liderado pelo presidente Lula, não é amigo aliado da mentira, não é amigo aliado da desinformação. E estamos procurando lutar contra esse ambiente que infelizmente foi fomentado fortemente na sociedade brasileira.
Falando mais especificamente sobre o Ministério da Justiça, o que o senhor traz para sua pasta no que diz respeito a ideias e estratégias contra desinformação, da sua experiência como governador e dos ataques que recebeu no exercício do cargo?
Essa ideia de integração. Nós não temos a pretensão de, sozinhos, dar conta do maior desafio que a humanidade tem hoje. Mudança climática é gravíssima, corrida armamentista é gravíssima. Mas, para mim, a maior ameaça que está hoje na esquina da humanidade é esse abuso geral em relação a essas tecnologias. Que vão até onde? Nós estamos discutindo aqui ferramentas, robôs, redes sociais, e já se forma no horizonte um universo imprevisível de manipulações derivadas das ferramentas de Inteligência Artificial a um patamar que nós não sabemos sequer qual é. Se for regrado apenas pelo lucro, eu diria que o inferno é o limite.
Se a busca desenfreada de lucro for o único parâmetro de organização desse negócio, isto vai levar a que todos nós aqui sejamos, no futuro, vistos como descartáveis, porque haverá supostamente um robô que julgará melhor do que os juízes, por exemplo. Ou ferramentas que irão compor textos, reportagens, melhor apuradas do que os próprios jornalistas. Isto é uma contra-utopia tangível, não é algo retórico, está no horizonte. 
Este tema tem essa densidade e não vai ser o Ministério da Justiça do Brasil sozinho que vai dar conta. Então, a principal contribuição é alertar, apontar, chamar atenção, pautar, como nós temos feito. É chamar os outros agentes de Estado, o que envolve o diálogo respeitoso, independente, porém, harmônico com o Supremo, com o Congresso e com as outras áreas de governo.
Nós temos a professora Estela Aranha [assessora especial de Direitos Digitais da pasta] que faz isso o tempo inteiro. Só o fato de ter esse setor no Ministério da Justiça já mostra a primazia ou atenção especial ao tema, assim como a criação da diretoria de Crimes Cibernéticos da Polícia Federal. Foram duas providências que nós tomamos — eu levei ao presidente Lula ele concordou. Nós temos essa articulação interna do governo, essa ideia de nova legislação e a articulação com os estados. Porque quando a gente fala de crime, nós precisamos que os estados nos ajudem.
Essa rede de laboratórios de crimes cibernéticos, vamos ter agora a reunião da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro e vamos fazer um debate específico sobre criptomoedas, criptoativos, como isso tem mudado a configuração do mundo da criminalidade no Brasil. Nós estamos sempre buscando essa atuação em rede com outras agências de governo, com a sociedade e também com os estados, para que eles sejam nossos parceiros.
2024 é um ano eleitoral, período em que circula muita desinformação que pode impactar o voto do eleitor. Existe algum diálogo com o Congresso para que haja uma mini-reforma eleitoral para essa ocasião?
Esse é um dos fatores que autoriza um certo otimismo quanto à votação do PL 2.630, porque, se não houver uma lei a um ano da eleição de 2024, quem vai regular isto vai ser o TSE, que já fez em 2022. Espero que o Congresso faça isso. Se não fizer, com certeza as resoluções do TSE vão fixar balizas, inclusive porque as ferramentas de mentira, de adulteração, de violação daquilo que o direito eleitoral chama de verdade eleitoral, estão cada vez mais sofisticadas. 
Há uma foto que se tornou icônica, a foto do Papa Francisco, com uma roupa que não era propriamente usual, eu diria. Você olha aquela foto e não identifica nenhuma chance daquela imagem ser falsa. Aí depois se revelou que era falso. Agora, você imagina isso em um processo eleitoral dinâmico em 5.570 municípios, em que você pode produzir, por exemplo, à perfeição, um candidato, qualquer que seja ele, fazendo uma coisa que ele nunca fez, ou dizendo uma coisa que nunca disse, a 24 ou 48 horas da eleição.
O chamado perigo da demora de uma resposta estatal é gigante, porque o processo eleitoral tem um dinamismo. Você pode movimentar 10%, 15%, 20% dos votos com uma fake news numa eleição municipal. Em cidades de menor dimensão, aquilo circula em minutos pelos grupos de WhatsApp. Então, acho que essa reflexão será feita pelo Congresso, porque, independentemente de posições ideológicas, se tem um tema que todos os 513 deputados se preocupam é a eleição, porque todos são fruto de um processo eleitoral e irão, normalmente, se submeter a outros. Pode ser que esse vetor estimule, ou então caberá ao TSE novamente editar uma resolução sobre o assunto.
O 8 de janeiro foi alimentado, sobretudo, por desinformação nas redes sociais a respeito do processo eleitoral. Como a Lupa mostrou, essas mensagens, de teor golpista, continuam circulando nas redes sociais, estimulando novos ataques às instituições. O governo tem monitorado isso? O que tem sido feito para evitar que atos como o de 8 de janeiro se repitam?
No caso do 8 de Janeiro, o governo estava virtualmente indefeso naquele momento porque era um governo recém-instalado, nós tínhamos cinco dias da posse. As ferramentas disponíveis, tanto no mundo material quanto no mundo virtual, eram pouquíssimas, porque era um governo se formando. Aqui, no Ministério da Justiça, havia pouquíssimas pessoas nomeadas no dia 8, porque as nomeações se estenderam até o final de janeiro, praticamente fevereiro adentro, porque há um procedimento jurídico formal. É importante dizer isso porque tem gente que pensa que o presidente tomou posse e no outro dia está todo mundo dentro das suas salas. Não, não funciona rigorosamente assim, infelizmente, ainda mais em uma transição tumultuada.
De lá pra cá, as coisas melhoraram muito, com ferramentas adequadas, jurídicas, de monitoramento de crimes, no geral, e isso resulta nos procedimentos que a lei autoriza — seja na esfera cível, seja na esfera criminal. Então, são centenas, na verdade, milhares de ações judiciais e inquéritos policiais derivados dessas ferramentas de monitoramento de crimes. 
Sempre digo que a pessoa pode dizer: “Eu não gosto do presidente Lula”. Ela pode dizer: “Eu odeio o presidente Lula”. Ela pode dizer: “Não votei e não votarei jamais no presidente Lula”. Mas ela não pode acrescentar: “Por não gostar, por odiar, por não votar, eu vou matar o presidente Lula”. Essa é a fronteira que nós temos estabelecido entre liberdade de expressão e crime. Então, você chega para o seu cônjuge e diz assim: “Eu não quero mais ficar casado ou casada com você”. Pode! Pode agredir o cônjuge? Não, não pode. Porque é crime. 
Então, não é violação, porque não estamos tratando de liberdade de expressão, nós estamos tratando de crime. E nesse caso dos crimes políticos, é essa fronteira que nós temos estabelecido e resultado nesses procedimentos legais, que estão aí aos milhares. As pessoas vão dizer que é censura, que é a ditadura. Fazem charge comigo dizendo que sou ditador, que sou isso, que sou aquilo, e eu estou só cumprindo a lei. Quem viola o código penal, na rua ou na rede, tem que ser punido. É lei. Esse é meu papel.
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Fonte:  https://lupa.uol.com.br/jornalismo/2023/08/02/quem-viola-o-codigo-penal-na-rua-ou-nas-redes-tem-que-ser-punido-diz-dino

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