segunda-feira, 4 de dezembro de 2017

Anos de enganos e duplicidade ou como EUA perderam a credibilidade


Bandeira dos EUA

© AFP 2017/ Josh Edelson

Américas

13:24 04.12.2017(atualizado 13:51 04.12.2017) URL curta

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Os fracassos da diplomacia norte-americana e a aparente incapacidade dos EUA de servir como garante da estabilidade nos assuntos mundiais mais agudos é um resultado direto de anos de engano e falsidade nas relações internacionais, assim opina Ted Galen Carpenter, pesquisador do Cato Institute especializado em política externa.

A credibilidade e a fiabilidade são dois pilares de uma diplomacia bem-sucedida, já que muito poucos países estariam dispostos a negociar e procurar compromissos com uma parte que mal os respeita.

O USS Destroyer (DDG 78), comandante de mísseis guiados da Marinha dos EUA, conduz operações de ataque enquanto no Mar Mediterrâneo, que o Departamento de Defesa dos Estados Unidos disse que era parte do ataque com mísseis de cruzeiro contra a Síria

© REUTERS/ Ford Williams/Courtesy U.S. Navy

Deputada democrata: 'EUA repetem erro do Iraque e da Líbia por lançamento de mísseis'

Várias administrações estadunidenses consecutivas ignoraram este princípio, deixando um legado de mentiras que prejudicaram toda a política externa do país, escreve Carpenter em um artigo para a revista The American Conservative.

O autor vincula o atual beco sem saída diplomático em relação ao problema nuclear norte-coreano com uma longa história de violações dos acordos e não cumprimento de promessas por parte de Washington.

"Durante a sua recente turnê asiática, o presidente dos EUA, Donald Trump, convidou o líder norte-coreano Kim Jong-un para a mesa de negociações e a 'fazer o que está certo', ou seja, renunciar às armas nucleares e ao programa de mísseis", lembra o autor.

Pressupõe-se que uma tal concessão resultaria em levantamento das sanções e em uma relação mais normal com a comunidade internacional. Mas, infelizmente, Pyongyang tem uma vasta lista de razões para não confiar nestes apelos.

Carpenter continua enumerando os casos mais destacados da duplicidade de Washington, que justificam a atitude cautelosa da Coreia do Norte.

Sistema de defesa antiaérea de mísseis do Irã

© AP Photo/ Ministério da Defesa do Irã

EUA podem empurrar o mundo para uma guerra nuclear se romperem acordo com Irã

Primeiro, o acordo nuclear com o Irã, que, apesar de os outros participantes testemunharem que Teerã cumpre as condições acordadas, é criticado pelos EUA, um de seus promotores na época, e corre o risco de cessação por iniciativa de Donald Trump, com consequências pouco previsíveis deste passo.

Segundo, o jornalista lembra o engano na Líbia, que demonstrou dois lados pouco agradáveis para os EUA.

Um, é que o líder líbio Muammar Kadhafi aceitou terminar o programa nuclear em troca do levantamento das sanções econômicas. Sete anos mais tarde, os EUA e a OTAN interviram no conflito interno da Líbia do lado dos rebeldes, e seus ataques aéreos e de mísseis balísticos ajudaram na derrubada de Kadhafi e no posterior destino do país árabe.

Outro, naquela época, o Conselho de Segurança da ONU aprovou uma resolução que previa restringir a intervenção militar com objetivo de proteger os civis. A China e Rússia, perante as declarações dos EUA de que se tratava mesmo de uma operação de segurança, não exerceram seu poder de veto da decisão. Mas o objetivo real — a derrubada de Kadhafi — se revelou apenas quando já começaram os bombardeios.

O autor cita a declaração do secretário de Defesa, Robert Gates (2006-2011), sobre a reação de Moscou:

Parada militar em Pyongyang (foto de arquivo)

© REUTERS/ KCNA

Exercícios conjuntos dos EUA e Coreia do Sul são 'ensaio de agressão' contra Pyongyang

"Os russos chegaram a pensar que eles tinham sido enganados na Líbia. Se abstiveram de vetar a resolução da ONU porque esta pressupunha a prevenção dos massacres […] mas logo ficou claro que a OTAN buscava derrubar Kadhafi. Considerando-se enganados, os russos começaram a vetar qualquer resolução parecida, incluído a da Síria dirigida contra o presidente Assad", afirmou Gates.

Mais uma duplicidade é a expansão da OTAN para o leste. Moscou afirma ter aceitado a reunificação da Alemanha, sob condição de que a OTAN cessasse a expansão em direção às fronteiras da URSS.

Dois altos funcionários, o secretário de Estado dos EUA, James Baker, e o ministro das Relações Exteriores da Alemanha Ocidental, Hans-Dietrich Genscher, ambos ofereceram garantias verbais de que a Aliança Atlântica se limitaria às fronteiras alemãs.

Claramente, este não foi o caso, e a "explicação" dos EUA se baseia em que não há documentos formais que refiram tais garantias. Coisas dessas "não inspiram confiança entre os governos", destaca Carpenter.

Imagem da Estação dos correios central de Pristina destruído pela OTAN, Iugoslávia, 15 de junho de 1999

© AFP 2017/ RUSSELL BOYCE / REUTERS POOL

Sérvia vai investigar as consequências dos bombardeio da OTAN em 1999

A invasão militar da Sérvia pela OTAN em 1999 — que uma Rússia enfraquecida não pôde impedir — levou à ocupação da região histórica sérvia de Kosovo. Nove anos mais tarde, a província decidiu oficialmente obter a independência de Belgrado.

"Estava claro que a Rússia e, possivelmente, a China teriam vetado uma resolução a respeito no Conselho de Segurança. Assim, os EUA e seus aliados se esquivaram por completo à ONU e aprovaram a independência de Kosovo por sua própria conta", comenta o autor.

Para os americanos, é doloroso admitir que seu país adquiriu uma reputação bem fundamentada de enganar em sua política externa, mas toda a evidência o demonstra, escreve Carpenter.

Esta "história de duplicidade e traição" norte-americana está entre as razões por que é tão difícil resolver a crise norte-coreana através da diplomacia.

"As ações têm consequências, e a reputação de Washington de ser pouco sincero tem complicado os objetivos dos próprios EUA na política externa. É um exemplo clássico de uma grande potência estar atirando no seu próprio pé", conclui o analista.

Fonte: https://br.sputniknews.com/americas/201712049997960-eua-politica-externa-erros-resultados/

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