sexta-feira, 4 de abril de 2014

Rússia não chora porta fechada pelo G-8

 

por Thalif Deen, da IPS

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O presidente russo, Vladimir Putin, espera a chegada dos líderes do G-20 para a cúpula do grupo em São Petersburgo, no dia 5 de setembro de 2013. Foto: UN Photo/Eskinder Debebe

Nações Unidas, 3/4/2014 – Quando as potências ocidentais, lideradas pelos Estados Unidos, decidiram expulsar a Rússia do Grupo dos Oito (G-8) países mais industrializados, se propuseram “isolar” o presidente Vladimir Putin por ter “anexado” a Crimeia. “E depois? Expulsar a Rússia das Nações Unidas (e do Grupo dos 20)?”, perguntou em tom de piada um diplomata asiático nos corredores da Organização das Nações Unidas (ONU), insinuando que só poderia ser uma fantasia política do Ocidente.

A expulsão da Rússia do G-8 não teve maiores trâmites, pois foi uma decisão dos demais membros do seleto grupo: Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Grã-Bretanha, Itália e Japão, com apoio da União Europeia como bloco. Mas o G-20 é uma coalizão integrada tanto por nações do Norte industrializado como do Sul em desenvolvimento, na qual têm grande peso as potências econômicas emergentes do Brics (Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul).

A Austrália havia advertido a Rússia de que poderia ser excluída da próxima cúpula do G-20, prevista para novembro, em Brisbane, nesse país. Mas isso é mais fácil de falar do que de fazer. Reunidos paralelamente à Cúpula de Segurança Nuclear, realizada em Haia, nos dias 24 e 25 de março, os chanceleres do Brics responderam à ameaça australiana. Em uma declaração divulgada durante a cúpula, os ministros disseram que “a custódia do G-20 pertence a todos os Estados membros por igual, e nenhum Estado pode determinar unilateralmente sua natureza e seu caráter”.

O G-20 agrupa África do Sul, Alemanha, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, China, Coreia do Sul, Estados Unidos, França, Grã-Bretanha, Índia, Indonésia, Itália, Japão, México, Rússia, Turquia e a União Europeia. Também conta com alguns convidados fixos. Quando, em 28 de março, foi votada na Assembleia Geral da ONU uma resolução implicitamente crítica à atitude de Moscou frente à crise na Ucrânia, os quatro sócios da Rússia no Brics se abstiveram, junto com outros 54 países. A resolução obteve cem votos a favor, 11 contra e 58 abstenções.

Chakravarthi Raghavan, editor emérito do South-North Development Monitor, com sede em Genebra, relativizou o impacto do G-8 e do G-20. “No melhor dos casos, são agrupações informais, autoformadas sem nenhuma legitimidade como meros exercícios anuais custosos onde ocasionalmente são produzidas reuniões paralelas de alguma utilidade”, opinou à IPS.

Raghavan também explicou que o G-8 nasceu (na realidade G-7, sem a Rússia) para atender problemas econômicos comuns e enfrentar a crise do petróleo de 1973, quando os países árabes se negaram a exportar petróleo para as nações que haviam apoiado Israel na guerra do Yom Kippur. Mas logo ficou claro que o processo dentro da agrupação não era efetivo, e o objetivo inicial de estimular um franco e espontâneo intercâmbio de ideias entre seus líderes fracassara. “A própria burocracia e os ministérios dos governos não queriam que o processo avançasse”, pontuou o veterano jornalista, ex-editor chefe do Press Trust of India, que cobriu temas da ONU por várias décadas para a IPS, em Nova York e Genebra.

No entanto, em lugar de suspender seus encontros anuais, os líderes do grupo continuaram se reunindo, mesmo depois de perderem seu enfoque original na economia e quando os resultados dessas cúpulas sempre estavam decididos de antemão. O então G-7 pouco a pouco começou a se pronunciar sobre todo tipo de assunto, mas nenhum de seus líderes assegurava que as decisões fossem cumpridas em seus próprios países.

Vijay Prashad, autor do livro The Poorer Nations: A Possible History of the Global South (As Nações Mais Pobres: Uma Possível História do Sul Global), disse à IPS que o processo que rege a agrupação a partir de 1998, quando a Rússia passou a integrá-la, é tão opaco quanto o que levou à virtual expulsão de Moscou. O G-7 nasceu em 1974, nas palavras do presidente norte-americano Gerald Ford, “para garantir que a crise econômica mundial não fosse vista como uma crise do sistema democrático ou capitalista”, recordou. A crise “deveria ser vista como um choque momentâneo, não como um desafio sistemático”, acrescentou.

Um novo posicionamento neoliberal, após o colapso da União Soviética, permitiu o ingresso da Rússia, a quem foi prometido que a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) não avançaria além da fronteira alemã, explicou Prashad, da American University de Beirute. No entanto, Raghavan disse que o G-8 se pronuncia sobre uma ampla gama de temas políticos, econômicos e de outras áreas, mas cada vez com menos efeito, como quando chamou sem êxito a conclusão da rodada de negociações da Organização Mundial do Comércio (OMC).

Algumas de suas posturas sobre a situação financeira mundial se diluíram e não se traduziram em decisões ou normas devido à forte pressão dos grandes grupos financeiros de Nova York e Londres, explicou o analista, autor do livro Third World in the Third Millennium (O Terceiro Mundo no Terceiro Milênio). Os especialistas consideram pouco provável uma expulsão da Rússia do G-20. E, no caso de ocorrer, terá limitadas consequências. Envolverde/IPS

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