domingo, 3 de novembro de 2013

O alimento que gera saúde

 

por Alexandre Harkaly*

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Foto: http://www.shutterstock.com/

O ser humano tem três demandas de formas de alimento que o satisfaz nos três âmbitos de sua existência: o alimento para a nutrição física, como proteínas, gorduras, carboidratos e sais que nutrem o seu corpo; o ar e aromas, componentes que o nutrem emocionalmente, por meio do respirar que harmoniza e equilibra animicamente; e o meio ambiente (o todo), que nutre os seus sentidos com cor, paladar, aroma, unicidade, coerência e integralidade. Com coerência, o espírito assume que o alimento é bom e daí o indivíduo se nutre, ele se sente saudável.

Sabemos por experiência e relatos da antiguidade, assim como de filósofos e pensadores daquela época, da importância de termos alimento puro, limpo e integral para que o processo do pensar possa se desenvolver com clareza, objetividade e criatividade, levando o ser humano a um processo de autodesenvolvimento e individualização do seu caráter. Sabemos também pela medicina oriental que a saúde começa na digestão e que os problemas digestivos afetam diretamente o pensar.

Sem uma integração e harmonização com o alimento perfeito, destes três níveis – alimento para o corpo, a alma e o espírito – o ser humano adoecerá. De nada adiantará fornecer uma ração completa balanceada se esta não for agradável de ser consumida, e se o ambiente onde este alimento for consumido não for condizente com as suas expectativas de qualidade de vida.

Que grau de confiança podemos depositar nos gêneros alimentícios, se na soja encontram-se vários resíduos químicos, ou se na água potável há contaminações de agrotóxicos, principalmente herbicidas, porém justamente abaixo do chamado limite de tolerância? Ou ainda se em tomates encontramos vários pesticidas, como inseticidas e fungicidas?

Os alimentos modernos, produzidos a partir de sistemas que são agredidos externamente, carregam em si os efeitos desta agressão, que são basicamente resíduos de agroquímicos, desequilíbrios organolépticos e pouca vitalidade – que pode, neste caso, ser entendido como uma ruptura da “integralidade” do alimento – algo que o mantém vivo, coeso, equilibrado, latente, com bom potencial de assimilação e que gera saúde.

Os alimentos que provêm da agricultura orgânica, de ambientes conservados puros e vivificados, carregam em si as características desta atividade que são o contrário do exposto acima: isenção de resíduos agroquímicos, balanço organoléptico e vitalidade, comprovada a partir de testes científicos.

Os melhores alimentos provêm de fazendas orgânicas e biodinâmicas que são projetadas e inspiradas no conceito “organismo fazenda”.

Como em todos os organismos vivos, quando falha um órgão essencial, o organismo não sobrevive. Este conceito pode ser transportado na prática para a fazenda onde, com falta de insetos, de fertilidade e de equilíbrio ecológico, a produção falhará, o “organismo fazenda” falhará ou ficará deficiente.

Podemos perceber o organismo agrícola como que é exteriormente limitado por uma forma, um limite e interiormente articulado por órgãos que funcionam integrados. Por exemplo água e solo são dois órgãos e devem estar saudáveis para produzir bons alimentos.

O que delimita uma propriedade agrícola? Um rio, uma barreira natural ou uma cerca? Sabemos que é a intenção humana que preenche o espaço do organismo adequadamente. A intenção humana saberá dar à estrutura de produção todos os elementos necessários para o seu desenvolvimento, para a sua vitalidade, provendo os espaços apropriados para os animais e para as atividades de produção e de desenvolvimento humano.

Se quisermos perpetuar a produção agrícola de forma limpa e sustentável, precisamos não só reconhecer, mas tomar como base para estudo e aplicação prática o conceito “organismo fazenda”, perceptível também na Teoria de Gaia, de James Lovelock, hoje totalmente aceita e inserida no meio científico internacional. Há uma linha evolutiva do organismo, cientificamente descrita, que parte da forma mais simples de vida até a mais complexa, a Terra em si. Esta linha parte do vírus ou bactéria, passando por organismos unicelulares, microrganismos do solo, ar e água, pequenas plantas, animais, o ser humano, a fazenda, o vale, o ecossistema vale ou região, a região como bacia hidrográfica, paisagem, continente e finalmente chegando à Terra, o planeta. Ao longo de toda esta linha evolutiva, o manejo destes organismos deve ser inspirado em sistemas de produção que sustentam, apoiam e desenvolvem o vivo, e não que paulatinamente matam os organismos com contaminações e depredações ambientais. O resultado destas ações salta aos olhos com o passar das gerações. Exemplo disso são áreas desertificadas por excesso de uso de químicos.

O biologista francês Francis Chaboussou propôs uma teoria para explicar a susceptibilidade de plantas e animais ao ataque de pragas e doenças: a teoria da Trofobiose. De acordo com ela, pragas só podem sobreviver em plantas que têm nível excessivo de nutrientes solúveis na sua seiva ou tecidos, como aminoácidos, açúcares, nucleotídeos e minerais. O excesso pode ocorrer por causa da inibição de proteosíntese, pela predominância de proteólise sobre a proteosíntese ou excessiva produção de aminoácidos. A inibição pode ser causada por pesticidas ou por nutrição desbalanceada. Excesso de aminoácidos vem do excesso de adubação nitrogenada química.

Com este fato, percebemos o quanto é fácil hoje “provocar” o surgimento de pragas e doenças nas plantas, por consequência, em animais e, por fim, no próprio ser humano. O desequilíbrio nutricional é muitas vezes sutil, porém leva a doenças degenerativas – no caso, principalmente por excesso de substâncias prejudiciais ou por falta de síntese das substâncias corretas.

O que foi descrito nos parágrafos anteriores mostra como que a “integralidade” do organismo e consequentemente no ser humano é perturbada, provocando desequilíbrio, levando a processos de doença. Não estão inclusas aqui nem as causas genéticas, nem as sócio psíquicas, que são componentes importantes e deverão ser abordadas em ambiente apropriado.

Precisamos produzir alimentos de modo que se leve em consideração os fatores descritos e que possa restituir o conceito de saúde, equilíbrio, sustentabilidade, sem que ocorra a cegueira imputada a nós por uma forma de pensar baseada somente no binômio causa-efeito, mas sim que se baseie no conceito “integração dos órgãos e manutenção do organismo”.

De que nos adiantará saber, por exemplo, que o Licopeno, carotenoide encontrado em tomate, protege contra câncer de próstata (alimentos funcionais), se o próprio tomate é, na sua produção, bombardeado de agrotóxicos que nos incutem esta e outras doenças? Para fazer valer a regra geral de que uma alimentação rica, farta e variada é a melhor receita para a saúde, ou para aplicarmos dietas baseadas em alimentos funcionais saudáveis, precisamos fazer valer também a qualidade orgânica e biodinâmica dos alimentos.

Aqueles profissionais que se acham responsáveis pela saúde do planeta e pela saúde dos seres humanos poderão dar uma grande contribuição se direcionarem suas ações à agricultura orgânica e ao consumo consciente destes produtos certificados que, mais do que nunca, também devem ser considerados remédios a serem assimilados de forma rotineira e diversificada. Quanto mais isto for feito, menor o perigo de perdermos a sustentabilidade ecológica do planeta e menor o perigo das contaminações e perda de qualidade dos alimentos e da qualidade de vida.

* Alexandre Harkaly é criador do programa no IBD CERTIFICAÇÕES com acreditação para ISO GUIDE 65 e com organizações internacionais de acreditação. Levou esta empresa a atuar internacionalmente em 20 países. Formado em engenharia agrônoma, é especializado em agricultura orgânica e biodinâmica, destacando-se como um dos membros fundadores da ABD – Associação Brasileira de Agricultura Biodinâmica.

** Publicado originalmente no site Mercado Ético.

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